terça-feira, 8 de julho de 2014

ESCOMBROS DA VERDADE


As cartas que escreveu, não são as cartas que gostaria de ter escrito. As que escreveu são cheias de dor, amarguras, ressentimentos... Retratam sentimentos machucados de um jovem inocente, que amava e por esta razão era cego. Mas o jovem, volta e meia, tem seus insights, como quem sonha acordado. O cérebro velho cede seu espaço ao novo e em cada novo instante de compreensão e aprendizagem, ele cresce. Mas o tempo avança e somam-se às incertezas, dúvidas que vão se avolumando em um campo imaginário, que só quem o possui pode chegar a este reservatório de ilusões, para querelar consigo mesmo, em busca da razão perdida, obra da cegueira conferida pelo amor.

A idade daquele rapaz já não é mais aquela dos primeiros tempos em que ser feliz era algo tão natural que nem se percebia o estar feliz. E da casa dos vinte ele pula para a casa dos trinta. O campo das ilusões agora é mais vasto e quanto mais dúvidas e incertezas e ausências de verdades ele percebe e sente, mais dolorida fica sua alma e o homem tropeça, tropeça mas não cai; seu senso de equilíbrio o mantém firme e aprumado e ele segue seu caminho pela vida, da vida que tem que ser vivida, não aquela sonhada nos tempos da inocência juvenil. Tal qual uma mulher posta entre o homem que deve amar e o homem que realmente ama e gostaria de ter. As sensações entre o ter e o ser entram em conflito. A vida é assim, mas há quem simplifique tudo e, por isto mesmo, os impactos dos contrastes são percebidos como amenidades.

E o tempo carrega ele para a casa dos quarenta, quando as ilusões começam a se diluir e as incertezas começam a ganhar contornos afirmativos; as dúvidas petrificadas começam a ser tocadas por alguém que precisa melhora-las, burilando-as, para que cessem os incômodos da alma.

Vem o tempo e o leva a casa dos cinquenta, quando ele já perdeu toda inocência e sem esta, dentro dele quebra-se o fino cristal, que sintetiza seu amor pela vida, tudo dentro de um frágil coração de menino adulto;

Seus sonhos se desfazem e a arca das boas recordações se parte, esmigalhando o coração...

Ele olha para trás e nada vê, salvo uma infinita tangente percorrida, chamada vida.

E o homem segue sua sina como fardo de tristeza aceita.
As cartas, que importam as cartas se o que escreveu era o que o moía por dentro?

O que restou foram escombros de verdades, como uma cidade destruída pela insanidade da guerra.

O jovem que chegou a casa dos cinquenta morreu por dentro, mataram-lhe toda a inocência e as cartas que não escreveu eram as que tinham real valor, só Carolina não viu.


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